terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

O mundo ganha um gênio e o gênio ganha um sósia

Macaé, meados de 1999, primeira série do ensino fundamental. Nova escola, e aquele neguinho dentuço vai conquistando a simpatia das pessoas, vai se tornando conhecido e amigo de muitos em sua redoma de alegria. Tudo corria bem, mas um outro dentuço, cerca de 10 anos mais velho, mudaria sua vida, sem a menor intenção.

"Olha o que ele fez, olha que ele fez, olha o que ele fez!" berrava Galvão Bueno quando Ronaldinho, somado à alcunha de Gaúcho, com 3 minutos em campo, dava um lindo lençol no beque venezuelano, estufava as redes do goleiro e corria para dar seu soco no ar, explodindo de felicidade. Pronto, a vida do tal menino macaense mudaria para sempre.

Dia seguinte, e a rotina chegou a ser engraçada: "Felippe, vi você na tv ontem!", "Felippe, vi você na tv ontem!"; ao chegar para o treino de basquete: "Ronaldinho, o que você tá fazendo numa quadra de basquete?". Pronto, o mundo ganhava um gênio e o gênio ganhava um sósia.
Igualmente ávido por bola nos pés, Felippe seguia sua rotina diária de comparações, risadas, aulas e peladas nos recreios da vida. E sempre que Ronaldinho aparecia, lá vinham mais conhecidos a comparar. Com certa razão... razão que se perdia quando o que se comparava era a técnica entre ambos. Uma covardia, uma vez que o Gaúcho teve muito mais sorte na vida.

Os anos se passavam e naquela crescente redoma do menino, ele ficava cada vez mais conhecido, por sua simpatia e cada vez mais inesquecível, por sua semelhança física com o famoso jogador. Mesmo quando transferiu-se e acabou escondendo-se na França(e curtiu muito, imagina-se, as noites na Cidade-Luz), no coração dos brasileiros, a magia futebolística de Ronaldinho Gaúcho não se apagara.

Após um certo tempo longe das câmeras, Ronaldinho re-aparece com cabelo a altura dos ombros. Um susto, a princípio, mas uma idéia que seria imaginada provavelmente pela mãe do macaense, e aceita com tempo pelo menino. Ok, vamos lá! Sem cabeleireiras ou produtos franceses, sem dinheiro, sem convicção e sem noção, aquele pequeno black-power se destaca naturalmente na multidão, até ter volume para cair, e com o ganho de altura e de convicação, se tornar proporcional.

A semelhança com Ronaldinho fez de Felippe alguém facilmente identificável, mas o colocou em situações minimamente estranhas. Como quando, após muitos anos insistindo com os pais, finalmente, aos 13, conseguira entrar para uma escolhinha de futebol. Com poucos meses de treino e nenhuma malícia, fazia parte da equipe que disputaria um "quase-campeonato" em Rio Bonito. Destro, sem malícia e novo no grupo, reza a lenda que sua escolha para ser o lateral esquerdo da equipe pelo técnico fora, em muito, por sua esperançosa semelhança com o craque do Paris Saint-Germain.

Em 2002, pentacampeonato na Coreia do Sul-Japão. A justamente subestimada equipe de Scolari chega com Rivaldo, Ronaldo, Roberto Carlos e um Ronaldinho que quase marcaria do meio-de-campo, no início do primeiro jogo, contra a Turquia. Apesar disso, Ronaldinho seria um excelente coadjuvante ao brilho da dupla de ataque, mas ganharia destaque eterno no jogo contra a Inglaterra, pelas quartas-de-final, quando marcou um gol antológico, deu uma assistência monumental e foi expulso. O nome do jogo.

Do outro lado do mundo, quantas vezes Felippe não teve de ouvir: "pô, foi expulso ontem", "deu mole!"... e o menino apenas ria, nunca se incomodou om a comparação com seu ídolo. Sim, se títulos geram ídolos, uma Copa confirma o lugar no Olímpo para aqueles que lá venceram. Imagina-se que naquele momento, que seria seguido de uma transferência para o mítico Barcelona, Ronaldinho conquistara muitas crianças, muitos meninos, meninos como Felippe, que admiravam e muito sua magia.

A essa altura, muitos dos conhecidos de Felippe não sabiam o nome do macaense. Comentava-se o nome, e a expressão de interrogação aparecia, dizia-se Ronaldinho e lá vinha a compreensão de todos. Inclusive um dos melhores amigos do sujeito, não o identificava pelo nome de batismo.

Anos de intenso brilho em Barcelona e de ligieiras mudanças estéticas em Macaé, afinal, os anos passam e as pessoas crescem. Mas a admiração das pessoas pelo craque não muda, e o novo batismo já havia sido consumado.

Diz um tio de Felippe que Ronaldinho "conheceu o outro lado", referindo-se as baladas corriqueiras nas carreiras de jogadores de futebol, e que isso pode ter provocado tamanho declínio a partir de 2007, provocando inclusive uma transferência para o Milan e ausência na lista de jogadores convocados para a Copa da África do Sul. Obviamente, perguntava-se sempre a Felippe o que tava acontecendo com ele, se ele tava bem na Europa, se precisava de algo. É, pois é.

Incrível, como os esmasmos de gênialidade que Ronaldo de Assis Moreira dava, impediam qualquer um de diminuir a hipnose quando ele estava em campo.

Até que Ronaldinho quis voltar a jogar no Brasil. Pronto, o circo estava armado. A tranferência mais polêmica da história do futebol brasileiro, incluíndo um leilão promovido por seu irmão-empresário-cobra Roberto, entre Palmeiras, que teve aval de Assis para dar a tranferência como certa; Grêmio, que chegou a organizar festa com caixas de som no estádio Olímpico para receber de volta seu filho; e Flamengo, que ficaria com o astro a partir da temporada 2011. E toda a torcida anti-flamenguista de nada adiantou. ídolo vestiria sim a imunda camisa, aos olhos do alvinegro-estelar macaense Felippe. Já com quase 20 anos, ele entende, mas sente a estranheza de ver seu ídolo-espelho mudar-se para o lado do mal. Ouviu e ouvirá muito ainda, sempre rindo a toa. Mas como o próprio Felippe disse: "Azar do HOMI, que terá(...) milhões de inimigos naturais. Não que a idolatria tenha mudado(...) Então explodam todos juntos. Nunca será tarde, Ronaldinho. Os homens de boa vontade o esperam a qualquer momento na terra de paz.
Amém.

8 comentários:

  1. Foda demais! Excelente crônica! Melhor foi a parte do "lado do mal"! Abraço irmão!

    ResponderExcluir
  2. Muito boa, muito boa mesmo. Continue fazendo crônicas como essas e continuarei lendo.

    ResponderExcluir
  3. ai cara iradooo essa cônica! Ta mandando bem ora caramba. Será que vai se tornar as crônicas de Felippe? espero que sim!

    ResponderExcluir
  4. Salve simpatia! Que encanto de de crônica.. vejo uma simplicidade riquíssima nas suas palavras, fluem como um rio calmo e brilhante que nos fazem parar só pelo gosto de ver passar. Vou acompanhar sempre, beijos

    ResponderExcluir
  5. simplesmente incrivel! Belo texto, bela historia! e esse Felippe ae, pultz, recalque purin! hahaha
    Ahá uhuul O Gaucho é nosso _X_

    ResponderExcluir
  6. Sou mais vc meu caro... mais inteligente e crítico, além de nunca se "vender"... parabens pelo blog e por torcer pra esse time, que é mais que um time: é um movimento!
    Abção.
    Cadu

    ResponderExcluir
  7. Muito bom! O texto leve e poético, parabéns!
    Bjs.
    Obs.: Tenho certeza que Ronaldinho vai cair em si e breve estará no meu Vascão!!!!

    ResponderExcluir
  8. Muito maneiro! O belo enredo e triste desfecho desse incrível jogador! Mas o que interessa é a qualidade do texto, meus parabéns Felippe! Sua excelente lembrança dos fatos futebolísticos e sensacional escrita. Gostei pra caramba!
    Abraçao!
    Rafael Martins

    ResponderExcluir